De Vigário à Marselha
quando a favela fala
o asfalto abaixa a orelha
De Vigário à Marselha
quando a favela fala
o asfalto abaixa a orelha
Não acredito em um eu que não dance.
O adulto é o jazigo da criança prodígio.
Olha lá a pomba, que bela pomba
a bela pomba bica tudo
bica pedra, bica milho
bica lata, bica chapinha
bica bola de gude, bica chiclete
bica poça, pedra e até moeda
se assusta e revoa entre berros e pernas
mas depois volta
bicando sandálias viradas, bicando óculos
bicando frutas caídas da sacola de compra
bicando cápsulas quentes
bicando dedinhos, bicando feridas
bicando peles frias
bica de tudo essa pomba
Amor não é para qualquer dois.
O que Jesus faria
ao se ver retratado
de olhos azuis?
O que faria o nazareno
desjudeuzado?
Destransfigurado?
Embranquecido?
O que faria
ao se deparar
como o filho de Odin?
O que faria?
Curto rimas gastas e confortáveis como tênis velho. Rimas naturalmente puídas. Rimas easy going. Rimas quase ímãs. Quase irmãs. Rimas parceiras. Rimas pronto-socorro. Rimas angelicais. Rimas que irão para o Céu. Rimas que a gente sabe que pode contar para o que não der e vier.
Não enlouqueça
somos apenas macacos
com dor de cabeça
Todo dia a gente se mata violentamente. Começa logo ao amanhecer. Enfiamos as unhas em nossas órbitas oculares e penetramos com a mão na cavidade até o antebraço. De lá arrancamos uma coisa frágil que a gente aperta até sufocar. Todo dia a gente oculta esse cadáver. Todo dia a gente remove corpos insepultos de nós. Todo dia. Tudo sempre na chance de, lá na frente, a gente se parir de novo.